sábado, 31 de maio de 2014

Olhos cansados

Olá leitores!

E é sempre bom pensar que são muitos.
Já faz um tempo que não escrevo nada e isso me dói muito. Não tenho tido tempo, inspiração e meu computador já teve dias melhores. Gosto muito do meu blog, o criei sem nenhuma inspiração a torná-lo maior, mas se o universo e o tempo forem a meu favor adorarei ver isso aqui crescer!.

Tempos atrás eu postava todo tipo de conteúdo: contos, resenhas, raramente algumas notícias e etc. Parei de fazer isso porque isso demorava muito e era uma boa desculpa para mim não escrever e além de tudo preferia postar os meus próprios contos. Mas não tenho tampo mais então voltarei a premissa original do blog “Propagar a ideia literária pelo mundo”, na verdade a premissa é simplesmente falar de uma coisa que gosto muito!


Então após seculos de escassez e escuridão voltam às páginas desse blog histórias extraordinárias!






   Estou vendo meu castelo pegar fogo. As águas revoltas do mar lambem as pedras do penhasco enquanto os raios riscam e iluminam o céu. A tormenta esta vindo, ela me persegue seja qual for o século.

   O cenário podia ser facilmente outro. Eu poderia estar parada nas areias úmidas de sangue, com a espuma da praia trazendo os corpos de homens tombados. Eu poderia estar esbarrando com armas deixadas por mãos decepadas e corvos cavoucando orbitas vazias a procura de mais entranhas. Tudo aquilo poderia estar a um estalar de dedos, ou há cinco séculos de distancia, eu já não percebia mais a diferença.

    Enquanto crianças gritavam excitadas, apontando os dedos e aparelhos celulares em direção à construção medieval consumida pelas chamas eu a olhava e pensava na ironia. A tempestade de verão havia queimado a rede elétrica que levava luz ao que agora era um sítio de visitação para turistas e culminara por atear fogo no trabalho de restauração feito de madeira para aquele velho castelo sobre o penhasco. Enquanto quinhentos e tantos anos atrás, eu e meus homens nos esforçamos quase até a morte para manter a fortaleza de pé sob a luz de tochas e o ribombar de canhões.

   Quem visse as lágrimas caindo pelo meu rosto eternamente jovem iria me achar uma grande sentimental por se comiserar pela destruição de um monumento histórico. Mas eles não sabiam (e nem poderiam!) imaginar que aquela não era e nem seria a primeira ou última vez que eu veria pedaços gigantescos da minha existência se indo com o decorrer do breve tempo deles, não restando nada, a não ser o temor de que, com o passar daquela prolongada vida, até mesmo a memória também se esfacelasse. Aos poucos…como os pedaços do meu castelo desmoronando desfiladeiro a baixo, direto para seu túmulo sob as aguas. Iria, finalmente, se juntar aos ossos ancestrais dos homens, aqueles que eu podia ainda ver caindo com suas espadas a nos defender, não parando de lutar mesmo quando a morte era certa.

   -Que horror! Uma pena, estamos perdendo parte da história… – ouvi um velho dizer ao meu lado, melancólico. Virou-se e pareceu por um segundo surpreso por fitar meus olhos mareados. Deu-me um aceno de cabeça e seguiu em diante, entre a multidão alvoroçada. Abri a boca, tentando expressar o que eu sentia para alguém tão velho, ele talvez compreendesse, com sua idade avançada, o que era estar diante da perda. Mas as palavras não saíram, pois logo sofri esbarrões de pessoas excitadas e percebi que a imprensa também chegara. Seus furgões e grandes antenas de transmissão me fizeram ver como tudo não passava de um espetáculo para seus jovens olhos fascinados.

   Eu dei as costas ao meu castelo, e para mais um pedaço de mim a morrer. Eu não precisava vê-lo queimar até as bases, já havia perdido coisas demais, lugares demais, pessoas demais…minhas cidades e rios, vozes e risadas, toques a escorrer pelos meus dedos como a areia daquela praia lambida pelas ondas indiferentes a toda sua história.

   A imortalidade é uma maldição que eu jamais teria aceitado se soubesse a que fim estava fadado o meu tempo ilimitado. Pois havia muito mais morte do que vida em se passar pela vida sem morrer.


Texto: Vêronica S. Freitas
Ilustração: Gaby Firmo de Freitas
Site origina: quotidianos.com.br

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